De aluno para professor: hora de refletir sobre nossas experiências

por Isis Mastromano Correia

Dia 15 de Outubro é o Dia do Professor e mais do que perguntar se temos ou não algo a comemorar, vale nesse dia fazer um chamamento a todos aqueles que lecionam, especialmente no nosso caso, a Música, é claro, para refletir sobre seu papel na vida dos alunos. Vocês estão educando ou apenas escolarizando as pessoas que passam por suas mãos? Escolarizar é passar o bê-á-bá, as teorias todas e lavar as mãos. Educar já é algo holístico, que fará com que a Música seja o veículo de ensino de valores importantes para toda as áreas da vida.

Diante disso tudo e do mundo de textos e artigos já existentes por ai sobre o papel do Educador Musical, pensei que mais do apontar para um calhamaço de teorias e fatos, nada seria mais concreto e honesto do que falar da minha própria experiência com professores de Música.

Mais do que dois mestres cruzaram minha vida nessa empreitada de aprender a arranhar seis cordas sem matar o vizinho ou a minha mãe de ódio. Porém, cito a história de dois professores, pois, sei que mais gente pode se ver em situações parecidas. Mas minha principal esperança é a de que professores que acessem esse texto possam refletir sobre sua própria postura e fazer uma auto-analise. Que usem esse Dia do Professor para uma reflexão séria sobre seu papel na vida de alunos tão raros e especiais como são os músicos e músicas desse país.

O professor, sobretudo o de Música, vai marcar a vida do seu aprendiz para sempre e de uma forma muito diferente dos demais tipos de professores. Mesmo porque o professor de Música geralmente é procurado, não é como o professor de português e matemática que já estão lá na escola a nossa espera todos os dias sem nem mesmo a gente pedir ou gostar! Diferente disso, o professor de Música é solicitado para estar do nosso lado.

Ele é especial, pois, marca a ideia de uma atividade que escolhemos por prazer, por gosto, para distração, para diversão (em uma parcela dos casos, sabemos, pode virar coisa séria depois), até porque no Brasil raramente, pelo menos até a Lei 11.769 de 18/08/2008 não “pegar” de verdade, teremos contato com um deles dentro da escola formal.

Eu me lembro até hoje do meu primeiro professor de guitarra e lá se vão 17 anos. Achava o cara um tanto folgado, sabichão demais, não dividia o conhecimento que tinha, não cativava, não sabia ser didático, imaginava pouco (e é bem estranho alguém ligado às artes ter a imaginação tão curta) e se prendia a uma teoria muito quadrada. Isso só para começo de conversa porque tem ainda a outra parte e essa quem vai entender bem é a mulherada: o sujeito tinha um “quê” de conquistador barato o que, claro, era bem indesejado e deixava as aulas mais tediosas ainda.

É, deu pra sacar que a minha primeira experiência com a guitarra não foi das melhores. Além de todo aborrecimento, o perigo e desserviço desse professor custaram caro: por muito tempo acreditei que “não tinha o dom” para a coisa. Mas é claro: professores são aquelas pessoas que nos espelhamos e meu espelho estava, naquele momento, todo embaçado, sujo.

Hoje eu sei que estava tudo errado naquela história, a começar pelo professor! Sei que aquele sentimento de frustração poderia e, principalmente, deveria ter sido evitado por ele, que estava ali não só para ensinar Música, mas, para fazer decolar uma vontade, um sonho. Será que os professores de hoje tem isso em mente?

Temo que muitos ainda só queiram fazer de seus alunos uma máquina de tocar 300 notas por segundo, um robô exímio em realizar com precisão os exercícios passados ou ainda, limitando-os de muitas maneiras possíveis.

Por outro lado, tive uma professora de canto e teoria musical e dessa também não esqueço porque é uma lembrança absolutamente oposta. Doçura e paciência são os adjetivos que me vêm à cabeça quando penso nela. Certamente foram características e valores que todos os alunos puderam usufruir e levar para si, para aplicar em suas experiências de vida.

Essa professora me deixou como legado muito mais do que o gosto pela Música boa do clássico ao popular, mais do que um interesse muito aguçado por todo tipo de instrumento musical, o que me levou inclusive às raias da loucura de desmontar às cegas minha primeira guitarra para ver que diacho afinal tinha lá dentro! Não adiantava ninguém me dizer o que havia ali: eu queria ver!

Eram muitas as aulas em que essa minha mestra pedia para a turma inventar um instrumento musical. Isso dava asas pra nossa imaginação e uma liberdade sem tamanho. “Viorela”, “pandeirola”, “bateflauta” foram algumas das nossas invenções de criança, isso há quase 15 anos. Tudo feito com a sofisticação do plástico, barbantes e afins, mas, principalmente sem amarras que pudessem pôr medo e limitar os aprendizes de Música.

Essa professora fazia questão de deixar tudo bem lúdico, mostrar que não precisávamos nos prender à formalidade das coisas na Música. Bem, essa professora não só marcou minha vida como continua como parte integrante e atuante dela. Eu ainda acompanho sua carreira musical junto de seu coral e não me canso de cutucar os amigos na plateia para dizer: “tá vendo aquela regente ali no palco? Ela é minha professora!”.

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Enfim, essa mestra marcou pelo fato de ter trabalhado em mim, nas crianças e jovens que passaram por suas mãos a curiosidade, o não-conformismo, a intelectualidade, o raciocínio, a gentileza, o dividir, o trabalhar em grupo, o estímulo da Criatividade, enfim, valores que carrego até hoje e não são de restritos ao mundo da Música de forma alguma.

Tornei-me jornalista e todos esses valores me são muito caros à profissão. E quis o destino (dizem que os iguais se atraem) que a minha carreira cruzasse com um  blog de Música. É por essas e outras que nós, aqui na SANTO ANGELO, sempre batemos nessa tecla: a Música não serve somente para formar músicos, mas sim, para formar seres humanos mais integrais, mais completos. Então, não é um simples “slogan da empresa”, sei, por experiência própria, que, verdade maior do que essa não há em termos de Educação.

Dito tudo isso, é claro, só nos resta aproveitar a oportunidade dessa data para agradecer por tudo aquilo que vocês, bons professores de Música fazem pela gente. Agradecer seus esforços que sabemos não serem poucos. Ensinar Música não é “matar um leão por dia”, e sim, ser o próprio leão e encarnar sua força para poder encarar todas as mazelas da nossa Educação já que a Música é bem o elo frágil do nosso sistema educacional.

Aqui todos vocês são tema recorrente, são e sempre serão estrelas. O espaço é de vocês para comentar sobre suas experiências e até mesmo contar quais foram os caminhos que um dia te alçaram do posto de aluno para o de professor de Música.

Até a próxima.

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