Acústica em grandes ambientes
Olá pessoal, tudo bem?
Nas nossas andanças “internéticas” diárias, às vezes nos deparamos com matérias em blogs que aguçam nossas percepções e conhecimentos. A Revista Backstage, publicação especializada em áudio profissional, é um desses raros oásis de informações técnicas de alto valor e sempre nos presenteia com ótimas matérias e excelentes questões.
Uma delas, que complementa um nosso post anterior escrito pelo Denio Costa sobre sonorização de ambientes, veio a calhar sobre um tema abordado inbox nas redes sociais da SANTO ANGELO por um dos nossos amigos, técnico de som em uma igreja evangélica.
O autor do post, Walter Ullmann, é um especialista em Acústica e autor de vários projetos na área. Confira o texto a seguir que teve como base duas igrejas que o Walter atendeu e segundo suas próprias palavras: “não pouparam despesas” parafraseando “John Hammond”, celebre personagem do filme “Jurassic Park I”. No entanto, como não existiu (pelo menos aparentemente) projetos bem feitos de Acústica, os resultados deixaram a desejam nos dois locais, deixando o Walter indignado.
Você, como musico evangélico ou mesmo com técnico de som, deve ter a consciência de como projetos, planejamento e acompanhamento rigoroso de todas as fases são importantes, além da montagem do sistema de áudio e o tratamento acústico adequado na entrega do Áudio de qualidade.
Quem sabe um dia você não seja chamado para uma missão dessas? Então vamos lá aprender com o Walter Ullmann.
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Я Не Поняла ! ou seja : Eu não entendo![1]
Recentemente fui chamado para avaliar dois sistemas de sons, pertencentes a duas igrejas diferentes, ambas evangélicas, mas de denominações diferentes. Dada as semelhanças entre as construções e sistemas instalados, as descrições que farei são válidas quase que integralmente para ambas. As poucas diferenças têm pouco peso numa analise mais abrangente.
Os dois locais eram realmente muito grandes, e não saberia dizer qual o tamanho de audiência que comportavam, mas seguramente ultrapassavam 1,500 assentos cada um.
Pois bem, fazendo a avaliação de ambos, pude notar que não houve economia na construção deles; da mesma forma como não se economizou em equipamentos de áudio e vídeo, tão pouco com sistemas de ar condicionado/ventilação e iluminação, tanto cênica (para os vídeos) como técnica mesmo.
Bem, como minha especialidade é áudio e eletroacústica, vou me ater apenas a estes pontos. Percebia-se que todos os equipamentos, eram de boa para excelente qualidade.
Mas em momento algum, notei que foi feito um projetinho básico para sua instalação e posicionamento dos mesmos. Em condições de uso, isso acaba se traduzindo em uma salada sonora quase que inacreditável para que tenha um mínimo de noção básica de sistemas de som.
Essa salada acaba sendo ainda mais misturada pela total falta de homogeneidade dos equipamentos. Inicialmente, tínhamos um PA, tipo L-C-R[2] que visivelmente não atendia toda a audiência. De forma que isso levou a instalação de mais caixas para melhorar a cobertura nas áreas sob os mezaninos (under balcony), depois de outras caixas destinadas para cobrir outras áreas dos anfiteatros e assim por diante.
Sendo que a bagunça não era completa, um sistema destinado ao FRONT FILL[3] também foi instalado, claro que as caixas usadas nesse sub-sistema também são radicalmente diferentes das demais. Nem sei se preciso comentar que não existe coerência de fase entre cada um desses sistemas, assim em determinados pontos da plateia, uma mesma informação chegava em até 4 tempos distintos (delays) o que dava uma tremenda falha na inteligibilidade[4] do programa. O que, convenhamos, num lugar cuja função principal é a difusão da PALAVRA acaba sendo um grande contrassenso. Ou não?
Ainda considerando apenas os sistemas de som, existia todo o sistema de monitoração da orquestra, do coro e dos preletores. Cada um deles configurado como um subsistema distinto. Não sendo isso o bastante, outro fato bastante comum em igrejas de qualquer denominação ou credo, todo o sistema de monitor está posicionado à frente daquilo que se pode chamar de PA PRINCIPAL.
Obviamente que se olharmos ambos os sistemas, PA e MONITOR, quando em operação, não teremos a menor chance de fugirmos da LEI DE MURPHY, ou seja, se vai acontecer algum problema, ele vai acontecer na pior hora possível e da pior forma possível.
Alias, graças a isso, não posso evitar elogios aos (pobres) técnicos de ambos os locais, pois eles se viram bem demais diante de tantas adversidades.
Mas voltando, a não economia de recursos em ambas as igrejas era notada muito facilmente depois de uns minutos de observação desses locais e é isso que me levou ao titulo desta postagem, ou seja:
Eu não entendo!
Acontece que, em momento nenhum, consegui notar algum traço ou intenção de um projeto de tratamento acústico naqueles locais. Pisos de mármore, enormes áreas envidraçadas, grandes áreas de paredes nuas (apenas pintadas) e absolutamente nada aplicado ao teto.
Minha pergunta seria a seguinte: se não houve economia de maneira geral, por que não se fez um projetinho básico de eletroacústica, contemplando posicionamento de caixas acústicas e uma previsão de tratamento acústico, que no mínimo pudesse propiciar a atenuação de algumas reflexões primarias?
Formas de se fazer isso existem e são bastante exequíveis e muito possivelmente o custo de um projeto desses, mais a execução do tratamento acústico seria uma fração quase ínfima daquilo que tem sido gasto no projeto global.
E é isso que eu não entendo!
O custo assusta? Não deveria, pois meio que historicamente, projeto e execução do mesmo ficariam em algo em torno de 3% ou 4% do custo global da obra, se não menos.
O detalhe é que agora, qualquer solução que venha a ser adotada em termos de acústica para ambos os locais, fatalmente vai ficar muito mais cara que se fosse realizada durante a construção e as obras de acabamento. Pois paredes não são mais passiveis de serem derrubadas ou alteradas, as cargas (peso) a serem instaladas no teto, deverão ser cuidadosamente avaliadas e projetadas, de forma a atender aquilo que já existe (projeto estrutural).
O próprio processo da eventual implantação dessas medidas ficará mais caro e problemático, pois fatalmente, em algum momento, vão prejudicar ou paralisar os próprios cultos, já que que por exemplo, a montagem/desmontagem de andaimes não será possível ou prática, nem a remoção deste ou daquele material não poderá acontecer e assim por diante.
Frequentemente, ouve-se de alguns lideres que esta ou aquela igreja nos USA, ou na Europa, tem um som maravilhoso, uma acústica perfeita, que nunca rola uma “microfoniazinha” básica e outros detalhes associados. Pergunto-me e pergunto a eles também:
Porque lá fora se dá tanta atenção aos projetos de forma global e por aqui, praticamente sem exceção, se foge da palavra projeto, como certa entidade foge de certo símbolo?
E nessa hora a resposta que obtenho é um silencio quase que constrangedor.
Afinal, o que é tão diferente entre nosso país e os demais países?
Obvio que existem exceções a isso, mas elas apenas confirmam a regra.
Por motivos de ordem prática dessa vez não foi possível a utilização de fotos, espero que compreendam.
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Interessante o texto, certo? Demonstra que ainda precisamos andar bastante com o profissionalismo no mercado de projetos e instalações de áudio e acústica, pensando sempre na contratação de técnicos certificados, que possam entender o ambiente e o necessário para entregar tudo com inteligibilidade 100%.
Pense nisso na sua igreja, no seu bar ou no seu show. Todos ganham com um som de qualidade.
Vemo-nos em breve. Um abraço!
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Dan Souza é CMO, Relações Artísticas, fissurado em tecnologia e música, além de baixista nas horas vagas e apaixonado por Publicidade, Propaganda, Literatura e Filosofia. Formado em Marketing pela UNINOVE/SP, faz parte, desde 2013, da equipe de Marketing SANTO ANGELO.
[1] Graças ao tradutor do Google!
[2] L-C-R, significa Left-Center-Right, um sistema de som onde temos, além dos canais direito e esquerdo, um canal central.
[3] FRONT FILL, (“enchimento frontal“) termo que descreve um sistema de som destinado a cobrir a área imediatamente em frente ao palco ou equivalente, uma vez que o sistema principal não consiga cobrir adequadamente essa região. Da mesma forma que existem os chamados SIDE FILL e DOWN FILL, respectivamente enchimento lateral e inferior.
[4] INTELIGIBILIDADE, termo que define o quanto se consegue entender de uma mensagem que esta sendo reproduzida num ambiente qualquer, tanto faz se é veiculada de forma natural (voz/grito), quanto através de um sistema de reforço sonoro. Quanto maior o valor em PORCENTAGEM, mais se entende o que foi dito. Cada tipo de ambiente, em função de seu uso, requer uma determinada faixa de inteligibilidade. Por exemplo, salas destinadas a conferencias ou tribunais devem ter valores o mais próximos de 100% possível, já danceterias podem assumir valores bem mais baixos. Em miúdos, se numa lista de 100 palavras as 100 são entendidas por todas as pessoas num local temos uma inteligibilidade de 100%, se nenhuma palavra é entendida temos 0%. Existem outros termos que se relacionam à INTELIGIBILIDADE que podem ser, por exemplo, PERDA CONSONANTAL ou de ARTICULAÇÃO, índice RASTI ou STI, mas pelo momento basta sabermos ao que eles são atrelados.