A sorte favorece os audazes

Fala meu querido leitor: tudo bem com você?

Você se considera um sujeito de sorte?

O norte-americano Anthony Robbins, conhecido por suas palestras sobre PNL (Programação Neuro Linguística) e autor dos livros “Poder Sem Limites” (1987) e “Desperte o Gigante Interior” (1992) ensina que “o encontro da preparação com a oportunidade gera o rebento que chamamos Sorte”. Ou se preferir um autor mais antigo, que tal essa frase atribuída a um dos mais célebres intelectuais do Império Romano, Lúcio Aneu Sêneca?

Enfim, estou relatando tudo isso devido ao encontro furtuito entre o guitarrista Rusty Anderson (músico da banda de Paul McCartney) com o luthier Renato Moikano ocorrido no dia 25/03/19, num horário livre entre as apresentações do eterno ex-Beatle em São Paulo.

O encontro, narrado nesse link do Portal UOL  teve a seguinte motivação: “O músico, que daria uma entrevista no Estúdio Aurora, em Pinheiros, na zona oeste da capital paulista, se deparou com a oficina do luthier Renato Moikano, a Major Tone Guitars, que fica no mesmo local. A curiosidade pelos instrumentos, principalmente uma viola caipira, o fez visitar o local…. “

Para quem não lembra, ou está começando a ler agora o blog SANTO ANGELO, poderá encontrar, por aqui, várias contribuições do Renato Moikano como esse post  com dicas para seguir antes de comprar um instrumento musical usado.

Ou seja, para quem não conhece o Renato, pode até achar que ele é um “cara” de sorte, mas, na realidade, ele é um profissional preparado que estava no lugar certo e na hora certa.

Por isso, é que procuramos divulgar conhecimento em várias áreas da carreira musical para preparar nossos leitores para oportunidades que surgem a todo instante, mas que não avisam antes.

Está explicado? Então conheça outros detalhes desse encontro, narrado pelo próprio Renato Moikano exclusivamente aos nossos leitores.

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Fala galera, beleza?

Segundas-feiras nunca costumam ser agitadas na oficina.

Desde que eu mudei boa parte da minha operação para dentro do Estúdio Aurora em Pinheiros, na zona oeste da capital paulista, tem sido assim. Normalmente também é tranquila a agenda do estúdio. Por isso não há muita explicação para eu estar na bancada até as 22h daquela segunda, 25 de março de 2019.

A não ser pelo fato de eu estar apanhando do sistema de pré-amplificação de uma viola Giannini de 10 cordas. Já havia horas que eu estava debruçado sobre ela, tentando solucionar um problema na saída XLR.

Foi quando uma figura na porta da oficina disse em inglês: “Boa noite, não quero atrapalhar. Você está ocupado com um conserto, certo?”.

Levantei os olhos e reconheci instantaneamente o rosto de Rusty Anderson, guitarrista que acompanha Paul McCartney nos palcos já há muitos anos.

Não sou um excelente fisionomista, mas é que vi Rusty muitas vezes: em telões dos vários shows a que fui, em transmissões de outros aos quais faltei, DVDs, trechos no YouTube… Por isso, vê-lo ao vivo, de perto, me deu um “click” instantâneo. Coloquei o ferro de solda no suporte e me levantei.

Ele estendeu a mão com um: “bom te conhecer, sou Rusty”.

Meu ímpeto foi responder com “eu sei, claro que sei.” Mas tentei ser sóbrio e sorri dizendo: “o prazer é meu. Sou Renato”.

Ele estava no Estúdio Aurora para gravar uma entrevista de última hora. A entrevistadora precisava de um espaço para conduzir o papo e, horas antes, havia agendado a reserva da Sala 2.

Antes de ir para a gravação, percebi a curiosidade brilhar nos olhos de Rusty ao ver o até então desconhecido instrumento na minha bancada. Convidei-o a examinar e assim apresentei os dois.

“Rusty, esta é a viola caipira.” Ou “Brazilian viola”, como escolhi traduzir para o inglês.

Coloquei o instrumento em suas mãos e ele começou tentar a deduzir a afinação: Lá, Ré, Fá sustenido… A viola em questão usava a afinação que conhecemos como “Cebolão em Ré” (trata-se de cinco pares de cordas afinadas em A, D, F#, A, D; os dois primeiros pares afinados em coro, os três seguintes, oitavados).

O apelido “Cebolão” vem do som triste que ressoa a viola, como se todos chorassem, exatamente quando cortamos uma cebola.

Minha boa fluência em Inglês viu-se realmente desafiada. Em conversas ou entrevistas com artistas gringos eu já havia despejado uma série de termos técnicos em Inglês.

Mas nunca havia pensado que alguma vez precisaria explicar pra algum estrangeiro a afinação da viola, um dos instrumentos mais brasileiros. Apelei à literalidade e resolvi explicar passo a passo a história por trás do nome da afinação.

E foi assim que arranquei uma risada de Rusty ao traduzir “Cebolão em Ré” como “Big Onion on D”.

Ficamos mais algum tempo ainda conversando sobre o instrumento cujo som ele definiu como “definitivamente sul-americano”. Falei de outras afinações, violas com 8 cordas e ensinei alguns acordes para Rusty.

Em menos de 10 minutos ele já estava confortável com o instrumento, brincando com combinações e arriscando improvisos. Ainda com a viola no colo ele demonstrou interesse em outro instrumento que estava na oficina para manutenção: um baixo Univox, réplica do Bass Hofner que seu amigo Paul McCartney imortalizou. Definitivamente uma noite de “violas”.

Coincidentemente, tanto o baixo quanto a viola caipira pertencem ao mesmo dono: o músico mineiro João Antunes, dono de uma carreira autoral brilhante, mas que até o momento não me perdoou por eu não o ter chamado para o encontro.

Minha explicação de que eu não sabia da vinda do guitarrista não colou. E antes que eu pudesse reagir ao interesse de Rusty pelo Baixo gêmeo ao do Paul, ele foi chamado pelos produtores para a entrevista.

“Falamos daqui a pouco”, disse ele antes de entrar para a gravação.

Não daria tempo. Já era tarde, na manhã seguinte ele teria alguns compromissos antes do primeiro de dois shows que fez no Allianz Parque em São Paulo. Mas durante a entrevista eu me lembrei de outra história relacionada ao ex-Beatle.

Em abril de 2011, eu ainda atuava como jornalista cobrindo música. Era também uma segunda-feira, dia 18. Eu acabara de voltar do Coachella Festival para Los Angeles. Estava de folga e resolvi dar um pulo na Amoeba Music, a lendária (e gigante) loja de CDs na Sunset Boulevard, no coração de Hollywood.

Diferentemente da minha cesta cheia de CDs, a loja estava muito vazia. Não devíamos ser muito mais do que 10 clientes espalhados pelo galpão de quase 2000 m².

Foi quando meu amigo Marcelo Costa, também jornalista musical, emudeceu. Eu me virei para ver o que estava prestes a causar um infarto no meu colega de ofício quando reconheci Paul McCartney, em pessoa, entrando na loja.

Estava acompanhado de um par de seguranças e duas ou três crianças, provavelmente seus netos. Paul de verdade, em carne osso, passando ao lado de um Paul jovem, de papelão, vestido com a farda colorida como na capa do clássico Sgt. Pepper’s.

Clientes e vendedores congelaram enquanto ele circulava com as crianças e se divertia. Viu o pequeno palco que ficava montado no meio da loja e contou aos netos: “já toquei aqui”.

Ninguém chegou perto ou pediu selfies. Todos apenas paramos e observamos. Eu tinha minha câmera pendurada no ombro. Paul faria, dentro de alguns meses, uma nova turnê pela América do Sul e tocaria no Rio de Janeiro. Meu treinamento (e instinto) jornalístico me obrigava a tentar colher um depoimento, uma frase, qualquer coisa.

Não fiz nada. Fiquei travado, observando de perto o ex-Beatle que ficou na loja por cerca de cinco minutos, no máximo.

Com o passar dos anos, vi diminuir a raiva que senti por mim mesmo durante muito tempo, por não ter pedido uma foto, um aperto de mão, qualquer coisa. Aos poucos percebi que tudo relacionado aos Beatles é quase um fenômeno natural: difícil prever ou planejar sua reação.

Mas é 2019. E Rusty está na sala ao lado, gravando a entrevista. Novamente fui pego de surpresa por uma situação envolvendo Paul McCartney. Dessa vez consegui ao menos pedir uma foto com Rusty, antes que ele voltasse para o hotel, a qual já dividi com você na abertura desse post.

Dias depois, soube que a fabricante do instrumento viu uma notícia sobre nosso encontro e o encantamento que Rusty teve com o instrumento, decidindo presentar o guitarrista com uma viola.

Enquanto escrevo este texto, minha mente flutua, imaginando como teria sido o papo de Rusty com Paul sobre o desconhecido instrumento.

E, já que sonhar é grátis, por que não imaginar que o próximo disco do ex-Beatles possa trazer uma música, com algum trecho de uma viola chorando na afinação “Cebolão em Ré”?

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Obrigado, Renato, pelo fantástico depoimento sobre esse fantástico encontro que de acaso não tem nada.  Tenho certeza que nosso leitor já entendeu como devemos estar sempre preparados para não desperdiçar oportunidades que podem custar várias noites insones quando não as aproveitamos como gostaríamos e deveríamos.

Ao final, gostaria de reforçar que dúvidas, comentários e sugestões (elogios também são bem vindos) podem ser escritas logo abaixo, nas redes sociais da SANTO ANGELO e do próprio Renato Moikano

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*Renato Moikano é jornalista e luthier. Trabalhou quase 15 anos cobrindo música até fundar a Major Tone Guitars, oficina especializada em construção, customização e reparos de instrumentos musicais.

Lygia Teles, é Relações Públicas e especialista em Gestão de Marketing pelo SENAC-SP. Desde janeiro/16 integra a equipe de Marketing e Comunicação da marca SANTO ANGELO.

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